Nasci para dar um sorriso

“Quanto vale uma vida?”

perguntinha difícil que sempre ronda a nossa cabeça

É quase um lugar comum dizer que as vidas de todos os homens estão entrelaçadas. Mesmo assim, é sumamente interessante pensar no que significa esse entrelaçamento levado às suas últimas conseqüências.

O exato significado de cada vida humana é algo que só Deus conhece, mas Ele quis dar-nos algumas “pistas”.

Uma delas é a revelação de que “suas delícias são estar com os filhos dos homens”, indicando com isso que Ele cuida de nós e prepara o momento certo de cada nascimento, de cada morte, de cada circunstância (por mais inoportuna que possa parecer aos nossos olhos turvos), a fim de acolher-nos com alegria no dia de nossa ida para o Céu.

Outra dessas “pistas” é ter-nos permitido formular (de acordo com outra série de revelações) a noção de Providência Divina, isto é: de que existe uma lógica por trás de cada acontecimento, que nos é oculta na vida presente, mas que conheceremos um dia. Afinal, quem é o personagem mais decisivo na História: um grande imperador, ou o sujeitinho que lançou o primeiro boato que — amplificado de boca em boca — acabou numa revolução destruidora do seu império? Um prego no lugar certo (ou no lugar errado, depende do ponto de vista), pode ser o componente de uma série infinita de “coincidências” cujo final pode estar a muitos séculos de distância. No fundo, a noção de Providência Divina liquida com as noções de “sorte”, “azar”, “acaso” e “coincidência”.

Há um certo caráter lúdico em tudo isso: nossos sonhos, nossas realizações, nossos fracassos, o que consideramos como sendo o mais importante na nossa vida, pode não ser exatamente o que Ele preparou para nós. Se imaginarmos a vida como um grande teatro, o que mais importa aos Seus olhos não é termos o papel principal, mas desempenharmos bem aquele que nos foi designado, por mais humilde que pareça.

Certas pessoas sabem claramente qual é o seu papel, e por isso têm o grave dever de desempenhá-lo bem (o contrário seria uma traição, mais ou menos remediável).

Outras, no entanto, sentem-se como náufragos que vão de onda em onda, sem saber direito se fizeram algo de válido ou precioso na vida. Sonhavam com uma carreira, mas tiveram que ficar cuidando de alguém que precisava delas; quiseram dedicar-se a uma atividade, mas ficaram doentes; pensavam que seria fácil ir para um lado, mas acabaram sendo levados para outro, etc. Sua dor é uma espécie de frustração resignada.

São essas últimas as que levarão o mais extraordinário e maravilhoso susto, no dia em que souberem que foram contadas entre as mais importantes figuras da História da Humanidade. Tudo graças ao entrelaçamento acima mencionado. Se um prego pode causar tanto bem (ou tanto mal, depende do ponto de vista), quanto mais um belo sorriso que deram a outra pessoa, movidos por uma boa e simples inspiração interior.

Naquela hora exata, esse sorriso pode ter desencadeado uma série enorme de atos de boa vontade, por parte daquele que o recebeu. Talvez estivesse a ponto de fazer uma besteira, ou de desanimar em seus esforços por portar-se bem, mas vendo aquele sorriso (que, para quem sorriu, foi a coisa mais trivial do mundo, da qual logo se esqueceu), mudou. Por sua vez — como num “efeito cascata” — esse sorriso se multiplicou, clareando amplas regiões desse mundo que tanto necessitavam de luz para superar as suas tristezas ilusórias.

O interessado não percebeu, mas naquele exato momento cumpriu o seu papel: fez a mágica dar certo, e os anjos do Céu urraram de alegria, como a torcida comemorando o gol que fez do seu time o campeão. Ele (ou ela) tinham nascido para dar esse sorriso. O resto foi lucro.