O prazer de voar de helicóptero

Quem já experimentou nunca esquece. Vêem-se as casas, as ruas, os campos, os lagos e as colinas de pertinho, como num avião prestes a pousar, só que mais devagar e demoradamente. Dá até para parar em cima delas. A perspectiva é infinitamente mais nítida do que qualquer apreciação que se possa fazer a pé ou de carro, por mais que se ande. Tudo faz sentido de repente: cada paisagem, e o lugar de cada elemento no conjunto podem ser vistos com toda a clareza.

Com as idéias e conhecimentos é exatamente igual, só que mais barato, e além disso muitíssimo mais excitante. Quem aprende a voar de helicóptero torna-se instantaneamente um guru, a quem todos acodem com respeito e reverência.

O mais divertido é que esse aprendizado não leva muito tempo. Basta querer: é coisa de um segundo. É certo que prolongar o vôo exige leitura, reflexão, conversas com outros gurus mais experientes, etc. Mas já nos começos dá certo.

Quem não voa de helicóptero nunca sabe bem onde está, nem para onde vai: tem poucos elementos para orientar-se, e quase sempre está cego para qualquer caminho alternativo. Suas únicas referências são o que os outros fazem, algumas placas indicativas, o costume de percorrer sempre os mesmos trajetos, e talvez algum mapa ou sistema portátil de posicionamento via satélite. Quanto mais desconhecido é o terreno, menores são as garantias de orientação.

O vôo de helicóptero da inteligência significa prestar atenção a um conjunto bem maior de coisas do que as que estamos acostumados no nosso dia-a-dia. Esse conjunto nem sempre está nos jornais, na televisão, no que diz a moda, etc. — onde tudo passa como o vento —; o sólido pode perfeitamente estar em outro lugar.

Alguns historiadores disseram — em frase um tanto poética, mas muito acertada — que “o início da Filosofia foi o momento em que o homem se ergueu”. Penso que isso vale para todo mundo: é o momento em que cada um de nós aprende a voar de helicóptero.