Cultura é saber o significado de muitas palavras

Os pingüins são aves que pertencem à família dos Esfenicídeos (Sphenicidiae, em latim). As palavras “orange” e “table” significam a mesma coisa em inglês e em francês. A peça “Hamlet” é uma grande obra do teatro e da literatura universais, e o seu autor é William Shakespeare. Fulerênio é o nome de uma molécula formada por átomos de carbono, e que tem a forma de um poliedro com muitas arestas. Seu nome é uma homenagem ao arquiteto Richard Buckminster Fuller, famoso por ter inventado a cúpula geodésica. As palavras “magnético”, “magnetismo”, “magnetita”, etc. derivam do nome de uma antiga cidade grega chamada Magnésia, onde se encontravam rochas que tinham o estranho poder de atrair metais.

Quantas afirmações como essas poderiam ser listadas? Tantas quantas são as possibilidades do conhecimento humano, ou seja: infinitas. A quantidade de nomes de pessoas e de palavras — incluindo suas traduções em todas as línguas — é tão grande que ninguém é capaz de conhecê-las todas. Além disso, milhares são criadas (ou postas de lado) no mundo todo, todos os dias.

O escritor Umberto Eco termina um de seus livros mais famosos — titulado “O Nome da Rosa” — com uma frase latina provavelmente devida a Guilherme de Ockham (século XIV) que diz: “nuda nomina tenemus” (“o que temos são apenas nomes”). Isso não é verdade, pois as palavras têm um significado e apontam para coisas e pessoas reais. Por isso mesmo é que os nomes são interessantes; cada um deles é uma porta para outras regiões da realidade.

Chama-se de “erudito” aquele que conhece muitos assuntos, muitos nomes, muitas línguas. Nem todos nós podemos ser eruditos, mas é razoável que todos tenhamos um mínimo de conhecimentos básicos, para não nos perdermos na vida.

Cada homem ou mulher possui dentro de si uma insaciável curiosidade, mas é comum que com o passar dos anos percam a esperança de satisfazê-la, e se contentem com o que já sabem. Uma parte desse desânimo deve-se à sensação de impotência que surge ao contemplarem o imenso volume de coisas que lhes falta conhecer. Para outros, no entanto, esse mar de coisas é uma delícia: é um grande jardim, cheio de flores que podem ser colhidas e admiradas à vontade.

A diferença entre as duas posturas é chamativa.

Aos desanimados talvez lhes falte a generosidade de “deixar as coisas serem o que são”, sem pretender de nenhuma forma dominá-las, nem fazer delas instrumentos para o poder, para exibicionismos, ou para outros fins análogos.

Os “curiosos alegres” são mais serenos. Não pretendem engolir a montanha: apenas querem passear nela um pouquinho. Para eles, qualquer coisa nova que aprendem é lucro. Não se preocupam. Diante deste mundo tão grande e tão cheio de coisas, o que fazem é apenas amá-lo. Sabem que há coisas mais centrais e importantes, e sabem o que é periferia. Isso lhes garante a orientação necessária para não se perderem. São, no fundo, um pouco filósofos (isso não é uma ofensa: é um elogio).

Alguns dos chamados “eruditos” são gente aflita e preocupada. Não querem que a sua memória falhe, e por isso passam a vida lendo e relendo as coisas da(s) sua(s) especialidade(s). Ficam apavorados quando algo lhes escapa, e vão correndo atrás das lacunas para preenchê-las com mais “erudição”. Quando conversam, às vezes são insuportáveis, pois a sua propensão para falar do que entendem é quase irresistível. Talvez seja esse um outro motivo para as pessoas refrearem a sua curiosidade. Pensam: “não quero nem de longe tornar me um sujeito desse tipo”.

Mas nem todos os eruditos são assim. Há aqueles que esquecem e trocam as coisas, e de vez em quando dão até vexame por não saberem de algo que todos imaginavam ser óbvio para ele. No entanto, por terem passeado alegremente por muitas montanhas (de conhecimentos), lembram com carinho das coisas que mais lhes chamaram a atenção, e estão firmemente ancorados no bom-senso. Apesar de esquecerem algo de vez em quando, essas pessoas acabam sabendo mais coisas — inclusive do ponto de vista “quantitativo” — do que os “eruditos preocupados”. Seu coração está mais em ordem, e aí ocorre o que diz o famoso dito popular: “quem ama, lembra”.

Amor, leveza e serenidade despreocupada: essas são as atitudes básicas de um bom “colecionador de conhecimentos”. Assim se chega a ter muita cultura, sabendo o significado — e também o peso — de muitas palavras.