O que esta xícara está fazendo?

Não se trata de um conto de fadas do tipo “Alice no País das Maravilhas” (um livro, aliás, excelente e que dá muito o que pensar sobre o modo de ser das pessoas). Não. Essa pergunta está feita no sentido estrito. A resposta que cada um der a ela é — a meu ver — decisiva para a sua própria trajetória intelectual.

A resposta óbvia é: nada. Uma xícara não faz nada por si própria; não tem cérebro ou mente, nem vontade, nem vida, nem nada que possa ser causa de um ato espontâneo seu. Sua ação, por assim dizer, é uma pura passividade, uma “ação instrumental” guiada por quem quer beber nela um café ou um chá. Talvez sirva também como elemento inspirador de uma obra de arte, mas mesmo assim ela própria não faz nada: quem faz é o artista.

Outras respostas só são possíveis se ampliarmos o significado de “ação” ou “ato”.

Um pedaço de urânio radiativo, por exemplo, vibra, age sobre os elementos circundantes, no sentido de jogar em cima deles pedaços dos seus átomos que vão se soltando. A ação assim descrita é similar à que em física se chama “ação” da gravidade — que é outra forma de influência de um corpo sobre outro —, às reações químicas, etc. Aplicada à xícara, a resposta poderia ser: a xícara está decompondo-se, isto é: lentamente se transformando em pó, o que de fato ocorreria se a deixássemos uns cem mil anos sobre a mesa (que se decomporia também nesse período). Essa resposta, no entanto, não parece ser muito interessante, pois depende de um grande contexto de interações que amarram a xícara a outros fatores externos a ela, complicando demais o assunto.

O olhar suficientemente penetrante — típico dos poetas — ajuda-nos a encontrar outra resposta: a xícara está “xicarando”, ou seja: sendo uma xícara. Simplificando ainda mais, poderíamos dizer simplesmente: a xícara está “sendo”. Para uns, essa resposta é “meramente poética” e a rigor não passa de uma fantasia pueril e até mesmo idiota. Outros, no entanto, descobrem aí algo muito sério e profundo: “ser” é um “ato”. A partir dessa constatação, todo o Universo, toda a Ciência e toda a Filosofia se iluminam, pois atinam com a causa profunda do viver, do interagir e de todas as outras formas de “ação”.

Isso é Metafísica: uma matéria interessante, e que se pode ensinar às crianças, mas não a alguns cientistas ou filósofos contemporâneos.